quarta-feira, 15 de julho de 2009

Vertigem

Com as chaves na mão, estava pronta para abrir a porta. Elevou o olhar e, lá estava o enfeite que eles haviam demorado a escolher, ainda lembrava do outro, era mais bonito, mas o dizer, enfim, era o mesmo, bem vindo. Não, pensou, melhor bater primeiro. O som amadeirado, oco, fechado, ressoou. Ninguém respondeu. Já não se sentia mais bem vinda. Na verdade, por que, mesmo, estava ali?

Precisava abrir aquela porta. Grande parte de sua vida estava trancada do outro lado daquele trinco. Girou. Abriu. Nem precisou usar a chave. Quantas vezes ainda vou, ou melhor, tive que lembrar o Senhor de chavear as portas? E se um ladrão... Que cheiro horrível! Um cheiro de flores mortas, de sonhos murchos, de verduras podres na fruteira, de esquecimento, de louça suja empilhada, de desinteresse, de toalha molhada, de frustração, invadiu suas narinas, inflou seu peito. Vertigem. E o que estava trancado, guardado, chaveado, veio à tona.

O desgosto saiu pela boca - amargo - no lugar de palavras nunca ditas, e formou, no chão, uma poça. Encarou-a de frente. Suor frio. Suspiro. Alívio. Só então percebeu que o Senhor segurava os seus cabelos.

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