quinta-feira, 3 de junho de 2010

Manhã de Inverno - Postagem temática

Lembro bem daquela manhã. Saí para tomar banho, um frio, mas um frio de arrepiar quem tá vestido, imagina eu que tinha que tirar a roupa ali no relento, naquele nosso chuveiro fora de casa? Se fosse um dia qualquer, enforcava o banho talvez, mas aquele era um dia especial. Lembro que, além de frio, o dia estava especialmente branco, o sereno congelado no chão crepitava com meus passos, e os campos esbranquiçados se alongavam horizonte a fora.

Abri a portinhola de madeira, senti a água envolver meu corpo, acordar o meu corpo. Foi então que vi os pessegueiros em flor – que visão! O rosa daquelas flores parecia ainda mais rosa em meio ao branco da geada.

Suspirei.

Suspirei sem saber quantas vezes lembraria daquele dia, da promessa que estava por fazer. 

Suspirei sem imaginar a quantos filhos e netos contaria sobre aquela manhã de inverno, de arrepios.

Em questão de horas, o gelo derreteu com o calor do sol, em semanas, as flores viraram fruto, conserva, schmier, quem sabe, e, passado quase meio século, aquela promessa resiste ao tempo e ainda me faz suspirar... Ah, cada vez eu amo mais a Carmem!

Uma homenagem aos meus avós Carmem e Alcírio.

Postagem temática sobre casamento


segunda-feira, 29 de março de 2010

Do Butiquim à Butique - Postagem Temática

Fim de tarde, de expediente e dos últimos trocados daquele senhor. João sai cambaleando. O sol deságua no horizonte, João, na rua. Ele dança embebido de um bolero que ninguém mais escuta, de uma indignação que ninguém entende. Balbucia por uns trocados, lhe viram a cara. Dona Maria, porque não agüenta nem o cheiro - que nojo! Marquinhos, porque tem vergonha, faz de conta que não conhece o tio. Antônio não conhece o sujeito, mas lembra do pai - que pena - e sente raiva, remorso e dó. Desvia o olhar. Vai para o outro lado da rua.
João não anda, dança sozinho até encontrar um possível par. Uma dama - a mais linda e terna e amável- com o braço estendido, o paralisa. Ela também não se mexe, com o olhar fixo, o encara.

Silêncio.

Ele - perplexo - não fala.

Tampouco ela move os lábios de manequim.



http://blogsintonizados.blogspot.com/

sexta-feira, 5 de março de 2010

O Retorno da Abelha - Postagem Temática


Depois das flores:

o trabalho,

a casa

e o mel




















Foto tirada durante viagem pela Rota do Sol - RS




sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Precisão - Postagem temática

Sabe aquelas imagens de ilusão de ótica? Não é incrível como se pode ficar durante um longo período enxergando uma certa imagem e, de repente, ver outra que estava ali o tempo todo sem ser percebida?

Às vezes isso acontece com pessoas.

Na minha infância, saía por aí com uma caderneta à procura de pistas. Elas estavam por onde quer que eu andasse. Elas estavam por toda parte. Elas estavam exatamente onde eu as escondia.

Há duas semanas comecei a fazer aulas de desenho a partir da observação – um disfarce para continuar brincando de detetive, na verdade. Razão pela qual não pude deixar de trazer um caderno extra.

17:10 – Estou desenhando a torre do relógio da cidade. O problema são os ponteiros. Não param. Que horas são no meu desenho?

17:15 – Incorporei dois jogadores de xadrez nos meus rabiscos. Há mais de duas horas que estão jogando. Então, decidi que fazem parte do cenário. Um senhor e uma senhora enrugados que fazem uso de dois exércitos de peças para lutar com a inteligência um do outro, e combater o tédio. Definitivamente não há espaço para o tédio, apenas concentração. Desenharia uma redoma de vidro em volta daquela mesinha se não estivesse participando de um curso de desenho de observação, mas... quase enxergo uma camada bem fininha e isolante ali.

17:40– Humanos são tão difíceis de desenhar. Mais do que relógios.

18:00 – Que sorte! Exclamou o rapaz – um dos que formou a pequena platéia para assistir o final da partida e quase bloqueou minha visão. A senhora ergueu a peça chave, trêmula, e disse, em vez de cheque – precisão, meu jovem. Fim do jogo.O sino bateu e a senhora seguiu balançando, ressoando, como se as ondas sonoras a sacudissem de leve. Precisão. Ela sorria. E ele também. Precisamente satisfeitos, como eu. Ajustei os ponteiros. Seis horas na torre e no papel... Duas pessoas. Dois ponteiros. A hora exata. Sorte? Pergunte ao relojoeiro. Ou ao desenhista. Ou à senhora. Precisão, meu jovem.