domingo, 30 de agosto de 2015

Laços invisíveis


Os rostos se aproximam, abrem-se em sorrisos, em um disparo de flash, lá está a foto de família. E como descrevem os versos de Leoni, “o que vai ficar na fotografia, são os laços invisíveis que havia”. Triste quando as pessoas se aproximam apenas para a fotografia, quando família pode ser mais que vínculo de imagem, de sangue, de genes ou de pura tradição: pode formar laços invisíveis nas minúcias do dia a dia, em grande parte, quando ninguém está vendo. É uma estrutura tão complexa que pode ser capaz de formar algo tão firme e, ao mesmo tempo, tão flexível.

Firme. Baseada em princípios, uma família é firme ao dizer sim e também ao dizer não, formando um porto seguro, em que seus membros não são estáticos, ancorados, mas juntos formam um partir e chegar, compartilhando descobertas. E, por mais que naveguem por mares distantes, permanecem enraizados no que há de eterno e bom, e não necessariamente os prende ao chão.

Flexível. Isso para que os braços consigam se esticar em um abraço, em um gesto sincero de amor, sem aquela rigidez seca que se desfaz em pedaços nos primeiros obstáculos. Flexível para aceitar cada um como realmente é, tornando possível conhecerem-se de verdade.

“Saber amar, saber deixar alguém te amar”, Herbert Viana cantou o que é importante aprender a cada momento, sendo que a família é a melhor escola, em que chegamos completamente dependentes, chorando, necessitados de atenção e carinho. Quando crescemos, podemos escolher entre trilhar um caminho em busca da independência de tudo e de todos, ou de interdependência, cientes de que ainda necessitamos de atenção e carinho, mas não somos os únicos e, sabendo disso, há muito para se fazer.  


                                                                          
sois da família de Deus”  Ef.2:19




* Outro texto que escrevi no Ensino Médio. Transbordando lembranças aqui.





quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Toda ouvidos


Fecho os olhos e sou toda ouvidos 
para o pulsar dos corações em um abraço demorado.

Fecho os olhos e sou toda ouvidos 
para uma história envolvente.

Fecho os olhos e sou toda ouvidos 
para um riso solto, bem sonoro.

Fecho os olhos e sou toda ouvidos
para uma boa música:
melodia, ritmo, timbre, letra e voz.

Fecho os olhos e sou toda ouvidos 
em um beijo suave.

Fecho os olhos e sou toda ouvidos
para a beleza da Palavra.

Fecho os olhos e sou toda ouvidos 
para o movimento do vento 
e da água da chuva, do rio, cachoeira, oceano, lágrima.

Fecho os olhos em oração, 
deságuo angústias, sonhos, tormentos, alegrias 
e procuro ser toda ouvidos para Ele sempre.



terça-feira, 11 de agosto de 2015

Árvores


Quando criança, depois da aula, esperava meus pais virem me buscar na escola. Nessa espera, crescia em árvores. Contemplava árvores. Subia em árvores. Nomeava árvores. Sim, nomeava as árvores com as quais compartilhava dessa espera.

Árvore dos Sonhos. Era um plátano grande, de troncos espessos, que sustentavam uma ponte. Lugar de travessia, de olhar para o alto e ver folhas verdes, depois amarelas, laranjas,  marrons, leves, caindo, pairando pelo ar, como sonhos que se vão, ao vento, depois galhos secos, e, então, tudo outra vez,  novinhas em folha: verdes.

Árvore da Esperança. Essa não era tão grande, mas perene, sempre verde. Não era fácil de subir, mas era acolhedora para ficar lá, sentada, ou então subir até o topo e vê-la de folhas para baixo, também olhar para o horizonte, para além do pátio da escola.

Continuo, ao longo da vida, à espera do Pai. E essa espera pode acabar em um instante, mas pode demorar um pouco mais; porém, não precisa ser entediante, pode ser repleta de aventuras, de histórias, de árvores, de nomes, de Sonhos, de Esperança.

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Jardins

    
    Nas dimensões da infância, a escola, as praças, as árvores, os professores, é tudo imenso. A vida parece não ter fim e, ao mesmo tempo, cabe inteira num instante: toda alegria explode num riso sincero, a birra num beiço que também não o deixa de ser. Os instantes passam e desfazem o momento, das migalhas forma-se a memória, do que cristaliza, doces recordações.
    
    Os corredores da escola já não são tão grandes, preenchidos por lembranças, momentos vividos, o que faz com que os mesmos olhos vejam de um outro modo. Os professores que por ali passam entram nas salas com a tarefa de ensinar e para isso não se desfazem do que verdadeiramente são. O conteúdo vem acompanhado por um jeito único de falar, rir, gesticular, ficar furioso. Sem demora, surgem as imitações, os risos. Crescemos, formamos opiniões, sentimo-nos grandes o suficiente para chacotear, porém não deixamos de ser crianças que gostam de imitar.

    Ao sair da escola, irrompendo em alegria, levaremos conosco não só um papel com a aprovação, mas também pedaços de profissionais que se doam – professores – semeando sonhos. E a nossa mente é, sem dúvida, terreno fértil, criando monstros, bobeiras, planos, além de minhocas e brincadeiras na cabeça.

    Quando entrei no jardim, encontrei uma professora acolhedora e amizades das quais usufruo até hoje. Lembro, também, de cuidarmos de uma lagarta e a vermos transformar-se em borboleta – incrível! – o que faz de mim apreciadora de jardins, de natureza em transformação.

    Ana Cristina apresentou-nos às letras com um Batalhão de Mário Quintana, deixando-me o gosto não só pela escrita, como pela poesia da vida em si. Mais tarde, viria a Roselaine colando estrelinhas por dedicação, a Sofia e a Aletéia com História e Música, e tantos outros com suas preciosas sementes. No Ensino Médio, o Elemar, professor de matemática, proclama “quem escolhe deixa!”, talvez a parte mais difícil em decidir – deixar para trás – mas imprescindível para seguir em frente; o que vimos nas lágrimas da Noeli ao ser escolhida paraninfa, em sua despedida, dissolvida no amor pelo que faz.



    E, por fim, a Lu com seus atenciosos rodapés, os quais guardo com carinho. Quem sabe um dia, de tantas sementes, letras, poesia, brote um livro em minhas gavetas, aquelas que organizam o pensamento em minha cabeça? Talvez. 



* Outro texto do Ensino Médio.